samedi 1 octobre 2016

Ser diplomata do Brasil

Ainda não sou diplomata. Serei um dia. Não sei quando, mas pretendo ser o mais breve possível. Será que eu gostaria de ter me preparado para ser diplomata pela minha família, desde os meus idos infantis? Não sei. Analisando hoje e agora, acho que não. Precisaria conhecer melhor o meu país. Não no seu âmbito político e intelectual apenas, mas quanto a sua profunda cultura, folclore e população. Um diplomata, antes de tudo deve ser um nacionalista. Não aquele nacionalista militarista ou alienado, que soa muitas vezes xenófobo, exaltando o próprio país, apontando o defeito de outros. Um nacionalista que sente-se muito bem entre o seu próprio povo, entre a sua cultura folclórica e popular. Um nacionalista que lutaria e defenderia sua população, por todos os meios necessários, caso fosse ameaçada. Um nacionalista que não fugiria à luta. Esse tipo de nacionalismo é construído socialmente nas brincadeiras infanto-juvenis, nos desafios cotidianos da vida adolescente, na amizade sorridente das diversões e serviços da vida adulta. Afinal, o que é o povo brasileiro?

Eu amo viajar de ônibus pelo Brasil afora, escutar as conversas e piadas, participar das brincadeiras e bate-papo, descer nas rodoviárias, escutar os diferentes sotaques do Brasil diverso e saber das especificidades folclóricas e culturais locais, que poucos "turistas" frequentam ou frequentarão. Também amo viajar em coletivos urbanos e acompanhar a vida cotidiana, muitas vezes sofridas, da população, ouvindo as conversas, pedindo informações as pessoas e acompanhando a dinâmica e o desenvolvimento cultural brasileiro. O que isso tem a ver com nacionalidade? Está no âmago da nossa população, do nosso povo o que é nossa essência, a emocionalidade do Estado que leva o nome de Brasil.

O Brasil subdivide-se, no discurso, entre o que é alta cultura, baixa cultura( sendo muitas vezes nem considerada como tal) e folclore( desconhecida por grande parte da elite, que a considera cultura, mas exótica, não sente-se pertencente a isso). Porém, na prática, o que mexe com os ânimos, com os brios, com o âmago da população em geral(inclusive da própria elite) é a baixa cultura e para alguns o folclore. Mas afinal o que é essa alta cultura, baixa cultura e folclore?

A alta cultura, poderemos considerar, como a música clássica de origem europeia, com seus concertos de instrumentos musicais, corais, óperas, entre outros do gênero, tão consumidos pela elite e parte da classe média brasileira, elogiados, no discurso, pelo povo brasileiro, que vive intensamente o que é chamado de "baixa cultura". A alta cultura também são as exposições de artes visuais, sejam abstratas, impressionistas, pós-impressionistas, esculturais, nacionais ou internacionais. Assim como a música considerada com MPB (música popular brasileira), com letras elaboradas, seja filosóficas sobre o amor, seja sobre a política e a sociedade, tendo inclusive, duas grandes rádios, de projeção nacional, que divulgam esse "alto nível cultural"; a rádio MEC e a MPB FM. São músicas, são artes para as pessoas "comportadas". Incluem-se aí algumas músicas de expressão popular antigas, muitas vezes depreciadas pela elite da época, como o chorinho, alguns lundus e sambas de raiz. Esse tipo de cultura é exaltada pela elite, em diversos meios afirmando: "isso que é cultura!" De vários lugares que viajei, pude encontrar espaços elitizados destinados à promoção desse tipo de cultura, sendo respeitados e valorizados , sobretudo pelas pessoas mais velhas.

Antes de falar sobre a baixa cultura, falarei sobre folclore, que de tão extenso, não cabe nessa postagem, pois é muito específico, devido as suas especificidades locais. O folclore não tem dono, nem autores, pertence a população local, que sentem uma felicidade enorme, toda às vezes que esse tipo de manifestação é promovida. É no folclore que faz sentido o pertencimento e, por isso a interação, com cantorias, danças e gargalhadas emotivas, pois é algo que vem de muito tempo, passando de geração à geração, não tendo um dono, um autor específico, faz parte da identidade de um povo específico. É o caso do jongo, capoeira, caxambu, cirandas, folia de reis, bate-bolas, são gonçalo, côco, cacuriá, carimbó, reizados, sambas, xaxado, arrasta-pé, blocos afro ou de afoxé, as danças e cantorias tradicionais indígenas de todos os lugares do Brasil, do Rio Grande do Sul, do Sul do Brasil, do interior de São Paulo, Minas Gerais, Mato-Grosso, Nordeste, Norte do Brasil, entre outros. A elite brasileira é apaixonada por estes folclores, no entanto não se sente pertencente, assistindo, muitas vezes essas manifestação com olhares exóticos. Tive contato com algumas manifestações folclóricas específicas do Rio de Janeiro durante minha infância e adolescência, pois, como não faço parte da elite, nada disso parecia exótico para mim. Porém, foi através da participação de um movimento estudantil universitário de origem popular, como foi os Encontros Nacionais de Casas de Estudantes, que conheci as outras manifestação folclóricas, demonstrada pelas delegações do Rio Grande do Sul, do Mato Grosso, de Pernambuco, do Maranhão, do Pará, do Amazonas, de Alagoas, da Bahia, do Espírito Santo, do Rio de Janeiro, entre outros. Deu para notar a diversidade dos diferentes brasis. Eu, do Rio de Janeiro, tinha o samba, o jongo, a capoeira, o ijexá para demonstrar e, cada delegação tinha as suas respectivas manifestações folclóricas. Participar de Encontro Nacional de Estudantes de Relações Internacionais ou da União da Juventude Socialista, no máximo promoveu-se a cultura "pop", com MPBs dançantes ou músicas de projeção internacional por causa da língua inglesa, nas chamadas "música techno", geralmente em boates paulistas, do sul do Brasil, Brasília ou qualquer outro lugar do Brasil. A elite jovem procura nas diferentes localidades, o que ela encontra em sua própria localidade.

A baixa cultura permeia todas as classes sociais, mas é negada, considerada incômoda e inconveniente pela elite mais velha, enquanto a elite mais jovem a utiliza apenas para promover a interação em espaços festivos. Sente-se pertencente, mas nega-a como cultura. Geralmente os maiores promotores da baixa cultura é a população negra e a população periférica. A exemplo do Funk e Pagode do Rio de Janeiro, do Rap e Pagode de São Paulo, das músicas de Axé, como o Bailão do Robyssão na Bahia e o Brega do Pará. A baixa cultura aceitável como música Pop ou de "massas" é a música sertaneja do interior de São Paulo, Mato Grosso, Goiás, Tocantins, o Forró eletrônico do Nordeste. O teor dessas músicas é o amor e questões sociais de forma explícita, sem uma aparente reflexão. Todas essas músicas, diferentes das músicas da alta cultura, são para ouvir, dançar e interagir, geralmente com movimentos pélvicos sensuais ou dançados em dupla. Por ser explícito, causa repulsa na elite, que tem a sua juventude altamente consumidora, sobretudo a universitária, que as promove nas suas chopadas ou grandes festas, mas não a promove em suas boates fechada. São esse tipo de música, que toca no âmago da juventude, que sente-se bem e feliz, sobretudo na interação com outras pessoas, mas a recusa, a nega sistematicamente, pois acredita que não é algo que o Brasil deva demonstrar para o exterior, como se o Brasil precisasse demonstrar algo para algum país, ou ter vergonha do que se tem na sua própria cultura.

Por acaso os Estados Unidos, ao divulgar sua música internacionalmente, como o Hip Hop, Rap ou R&B, tem vergonha que suas músicas e video-clipes falem explicitamente sobre sexo, criminalidade ou amor? Por acaso a Europa tem vergonha das letras de músicas de alguns Rock n' Roll mais pesados que falem sobre anti-cristo, coisas demoníacas, suicídio, mortes? Como deverá ser as músicas dos países africanos? Por quê eles não chegam até aqui? Como deverá ser as músicas dos países de língua francesa, alemã, italiana, chinesa, japonesa? Por quê eles não chegam até aqui? O que os árabes, a ásia, a América Latina e o Caribe tem para nos mostrar? E a Oceania?

Até parece que desviei do foco. Talvez o título dessa postagem deveria tratar alguma coisa sobre cultura brasileira e seus parâmetros. Posso até ter fugido do tema, no entanto, vim aqui para demonstrar que para ser diplomata do Brasil tem que defender o Brasil e isso inclui a sua cultura, sem nivelá-la no que pode ser cultura ou não. Não é apenas a Bossa Nova, o Samba de Raiz ou a MPB que fazem parte da cultura brasileira e, por isso, deveremos ter orgulho do que nós somos. Nossa nacionalidade não pode basear-se na negação do que somos. Esse é o Brasil, queira ou não, ainda que haja tanta coisa para discordar, como a exemplo do próprio nome,  a bandeira do nosso país e o formato da nossa independência.

O nome Brasil está ligado à madeira extraída sangrentamente para ser utilizada para exportação. É o nome de uma árvore que foi transformada em mercadoria, devido a sua coloração avermelhada. Destruiu-se a Mata Atlântica, que permeava nosso litoral, para avermelhar a indumentária da nobreza europeia. Foi esse o nome do nosso país, é essa que foi a herança da nossa nacionalidade. A nossa bandeira está ligada a herança da Dinastia dos Braganças(em verde) e a Dinastia dos Habsburgos(em amarelo), que nos colonizaram, com base no exclusivismo colonial, genocídio indígena e escravização de africanos. A nossa Independência, diferente de outros povos e outras nações fora feita por um estrangeiro e filho do antigo colonizador. Não temos vergonha  disso, ou temos? A maior parte da população brasileira não sabe, nem conhece bem a História do Brasil. Será que é proposital?


Ser diplomata do Brasil, para mim, significa defender os verdadeiros interesses do povo brasileiro, co orgulho, persistência e perseverança.

Não faço parte da elite brasileira, nem faço parte de alguma elite intelectual do Brasil, bem como não fui preparado para ser diplomata. Não tenho criação de berço, como a história de vários diplomatas e estadistas do Brasil. Sou uma pessoa, um ser comum, que não nasci para ser elite, Não estudei em escolas tradicionais do Rio de Janeiro, nem tive viagem ao exterior, nem tive acesso a bibliotecas e obras clássicas da literatura brasileira. Sou um jovem comum, carioca, da população brasileira, mas quero me tornar um diplomata.

Minha formação?

No povo brasileiro.

Desde criança brincava de carrinho de rolimã, descer rolando ladeira em pneus velhos, subir em pés de goiaba branca ou vermelha, jamelão e manga na Baixada Fluminense. Na zona norte ou parte da Zona Oeste jogava fliperama, corria de bate-bolas, jogava taco ou altinho na rua, soltava pipa, brincava de pique-pega ou pique-esconde. Fiz capoeira, participei de escolinha de futebol no Aterro do Flamengo, ia para a praia, pegava carona em ônibus e no bondinho de Santa Tereza, pegava doce de são Cosme e Damião, tocava bateria em Escola de Samba-Mirim, dançava quadrilha de festa junina na Igreja, assistia e ia nos bailes funks da Furacão 2000, entrava de graça no Maracanã e em São Januário com meus irmãos, na Zona Sul e Centro da Cidade. Samba, capoeira, bate-bola, eram parte da minha cultura, mas nem por isso minha mãe deixou de me colocar para estudar música clássica, cantar ópera, fazer artes visuais, natação, cursinho de inglês e ir para a escola.
A minha adolescência foi trabalhando como ambulante, vendedor de jornais, jovem-aprendiz, office boy, cantor de óperas, pontas em programa e novelas da televisão, ao mesmo tempo que frequentava matinês e casas de forrós, baile funks, festas luxuosas de 15 anos, shows gratuitos na praia, pegava onda de body board com os amigos, ia para o cinema e shopping center, curtia o carnaval de rua e da avenida Sapucaí, seja como integrante ou com assistente, na Zona Sul, Zona Norte e Centro da cidade.
Tive essa formação cultural multifacetada até chegar aos 18 anos de idade, quando não pude entrar na universidade, pois não tinha renda para me manter lá, mesmo sendo gratuita. Eu não poderia parar de trabalhar para ficar só estudando em horário integral, pois não tinha família que pudesse me manter. Fui para o Exército, depois fiz um monte de concursos para a carreira militar, que dava o dinheiro imediato, assim que assumisse, junto com alimentação, fardamento e moradia. Eu até queria a carreira de oficial, pois eu já sairia dali com uma saber equiparado ao nível superior, tendo assegurado a moradia, alimentação e fardamento, mas não deu, me tornei e praça e não tenho vergonha disso. Nem por isso parei de me divertir. Dos meus 18 aos 22 anos de idade, além de namorar, continuava tocando em orquestra e bandas de música, cantava em coral, fazia inglês, curtia as noites da Lapa, do Leblon, do Humaitá, da Lagoa, da Tijuca, de Botafogo, de Madureira. Frequentava shows de pagode, samba, às vezes bailes funks, baile charme, feijoadas, parques aquáticos e candomblés.
Por causa do trabalho em horário integral, a primeira vez que fiz faculdade foi a modalidade à distância do CEDERJ-UFF, ainda que pública, era estigmatizada, por dizerem não  ter qualidade. Eu comecei a faculdade com 21 anos, estudando em casa e tirando as dúvidas presencialmente nos sábados o dia inteiro. Eu havia passado para faculdade pública antes, aos 18, aos 20 anos de idade, mas todas elas eram integrais, então tive que escolher trabalhar a estudar. Só pude fazê-la quando realmente tivesse condições.
Entrei na universidade pública comum com 23 anos de idade. Foi na UFRJ, com o objetivo claro de me tornar diplomata. O intercâmbio que fiz foi para aprender inglês. Não foi acadêmico. Eu nem sabia o que era militância, quando me chamaram de militante pela causa negra pela primeira vez. Eu estava preocupado em permitir que mais jovens, parecidos com a minha realidade social, entrasse na universidade também,  bem como fazer os estudantes africanos e caribenhos tão integrados na sociedade acadêmica universitária, como os europeus e os latinos eram. Isso levou  oito anos da minha graduação. Eis a minha formação para ser diplomata.

É lógico que não tenho formação de berço. Estou correndo atrás para adquirir o mínimo conteúdo para passar nesse concurso público, que a mim parece muito difícil. Não acho impossível, porque minha história de vida foi de ultrapassar barreiras. Quero melhorar o Brasil. A diplomacia é a minha área por isso, pois somos algo por parâmetro. Devemos ter orgulho de todas as contribuições civilizacionais e culturais que preencheram a identidade do povo brasileiro, como a Indígena e a Africana. Não podemos discriminar ou negligenciar as suas culturas dinâmicas. Não podemos dizer que o Brasil é uma democracia racial, uma miscigenação, apenas pela retórica, assim como não podemos utilizar tais conceitos para hierarquizar as relações sociais do Brasil.

Ao estudar para a carreira diplomática, observando o conteúdo na área econômica, geográfica e histórica, cada vez mais consigo entender a injustiça que a elite brasileira fez com o povo brasileiro, sendo a política e o direito apenas meios para uma retórica  doce e os argumentos falaciosos para justificar a auto-exploração. Todos esses potenciais a quem serve? Toda essa justificativa protege quem? Ou eu ainda não tenho maturidade o suficiente para entender o conteúdo exigido para a carreira diplomática( por isso ainda não passei na prova) ou eu tenho que fingir que compreendo e aceito o conteúdo(para assim passar na prova).

Não acho justo o que fizeram na história com os imigrantes italianos, japoneses, alemães e eslavos, os colocando em condições sub-humanas de transporte, habitação e trabalho, através de uma política pública promovida pelas elites, mas também não posso desconsiderar, como às vezes negligenciam, o massacre sistemático que fizeram com o povo indígena e africano, até hoje, com seus descendentes diretos e indiretos. Será que o discurso do progresso e do desenvolvimento é para isso? É o famoso mal necessário?

Não acho justo o potencial agrícola, fundiário, industrial e populacional que o Brasil tem, ficar com o capital concentrado na mão de poucas famílias, em uma elite incipiente, que prejudica a formação educacional da maioria da população, devido a seus conservadorismo e a incapacidade de se renovar como classe. Não acho justo os déficits habitacionais e o sub-consumo alimentares de parte da população brasileira, sabendo que temos soberania agrícola em diversos produtos que compõem a nutrição básica de um ser humano.

Não acho justo termos uma justificativa pacifista no mundo, de reconsiderarmos as diversas ações beligerantes, de buscarmos o diálogo, enquanto internamente temos um Estado completamente coercitivo e violento com parte da população, com índices de mortalidade em  conflitos armados, sendo incapaz de socializar a população marginalizada,

Não podemos ser falsos ou hipócritas conosco. Somos um só país, uma população imensa com diversos povos. Devemos descobrir a nossa vocação. A nossa vocação estará dentro de nós mesmo, em nosso interior, como aquela cultura, aquele ritmo sincopado que toca em qualquer lugar do mundo e você saber que é do Brasil, se identifica e dá aquele sorriso bobo. Não faremos do Brasil uma nova Europa, nem um modelo para ser bem visto ou respeitado pelo ocidente. Devemos, acima de tudo, respeitar a nossa população, para conformarmos de uma vez por todas um povo, que representa muito bem o que somos e o que temos. Sejamos a união das nossas qualidades e o respeito das nossas diferenças. Se conseguirmos exaltar o  nosso povo, que tem elementos indígenas, africanos, europeus, asiáticos, seremos uma referência para o respeito para os povos indígenas da América Latina, para o orgulho dos povos da África, um exemplo para a civilização europeia e asiática. Em um país continental como o nosso, com os recursos e potenciais que temos, sem a necessidade de se impor para o mundo, com o intuito da dominação, da hegemonia, poderemos ser o país além dos discursos, mas sim das ações.

Isto é ser diplomata do Brasil para mim.

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